sábado, 30 de maio de 2020

DecapAttack

Nem Altered Beast, tampouco Sonic the Hedgehog. Meu primeiro jogo de Mega Drive foi uma aventura de plataformas estrelada por uma múmia sem cabeça. "Mas como assim?", indaga o incauto leitor. "Senta, que lá vem história", responde este singelo escriba.


No início dos anos 1990, Master System e NES eram o aparelhos de videogame dominantes no mercado. Eu ainda me virava com Atari 2600 (meu Supergame VG-2800 da CCE) e MSX (o garboso HotBit HB-8000 da Sharp/Epcom). Só tinha contato com os demais sistemas através de amigos e vizinhos que possuíam tais equipamentos. E assim vivenciei aquela geração, sem nunca ter um dos consoles. A situação começou a mudar quando meu irmão ganhou de presente o mais glorioso dos videogames: ele mesmo, o inigualável Mega Drive.

Na época, a Tec Toy (já consolidada no mercado com o Master System) dava seus primeiros passos para lançar o console de 16 bits da Sega no Brasil. O preço do produto nacional ainda era proibitivo e nem todas as lojas tinham o equipamento em estoque. A solução foi a mesma de sempre daqueles tempos: recorrer ao mercado "alternativo", "paralelo", pirata mesmo. E assim, eis que em uma bela tarde, meu irmão e meus pais retornaram de uma jornada até uma loja piratex com esta preciosidade:


O glorioso Mega Drive, em sua versão japonesa! Não importava se a caixa era branca ou preta. Ali estava o console, pronto para oferecer a melhor jogatina possível. Só mais tarde fomos prestar mais atenção nas questões de compatibilidade, de regiões, etc. Enfim, restava tirar o equipamento da caixa, conectar ao televisor e jogar. Mas onde estava o jogo incluso? A caixa só trazia o aparelho, um controle, cabos e o manual de instruções. Quem mandou comprar equipamento "alternativo", não é mesmo? Assim, o jeito foi adquirir um título junto com o console.


Meu irmão e meus pais trouxeram para casa um jogo cuja arte de capa mostrava uma múmia sem cabeça a jogar uma caveira na direção do espectador, com um símio amarelo ao fundo. DecapAttack. O verso trazia mais algumas imagens de fases coloridas e seres gigantescos.
 

O cartucho repetia a arte da capa. No verso, apenas aviso de cuidados na utilização do item. Nenhuma logomarca da Sega ou de qualquer empresa, tanto no cartucho quanto na capa. Mas quem se importa? Está na hora de jogar!

 
 

Inseri o cartucho no console, liguei o aparelho e esta singela tela surgiu.


A seguir, a primeira imagem que vi no Mega Drive.


O esqueleto multi-colorido começou a se espalhar pela tela, com sons de tremores. Na seqüência, uma imagem de um cientista louco e seu lacaio, a dar detalhes sobre a situação. Monstros ameaçam tomar conta do mundo e é preciso enfrentá-los. Após isto, surgiu a tela-título, sem qualquer referência à Sega ou qualquer outra empresa responsável pelo jogo (pirataria completa ou seu dinheiro de volta).


Muito jogamos, meu irmão e eu. Após entender o funcionamento do jogo e dominar os controles, em pouco tempo estávamos avançando pelos estágios. Alguns eram bastante fáceis, outros requeriam mais paciência e/ou destreza. Mas a jogatina se mantinha interessante.

Originalmente, DecapAttack foi desenvolvido pela VIC Tokai e lançado pela Sega em 1991. É um competente jogo de plataformas, com progressão lateral, em que o jogador controla Chuck D. Head, uma múmia sem cabeça que deve enfrentar monstros a fim evitar a invasão de seu mundo e, ao final, recuperar sua forma humana. Para tanto, Chuck pode lançar contra os inimigos uma caveira que coleta durante as fases, atacar com o rosto anexado a seu abdômen, pular sobre suas cabeças ou utilizar poções encontradas em diversos lugares.

"Para vencer neste jogo, você tem que usar sua cabeça". Literalmente
Na verdade, trata-se de uma modificação para o mercado ocidental de Magical Hat no Buttobi Turbo! Daibouken, obra lançada no Japão em 1990. Personagens, itens e cenários foram alterados mas, na essência, é o mesmo jogo.


A obra possui gráficos charmosos, bons efeitos sonoros e uma trilha sonora competente, embora repetitiva em alguns momentos (mas nunca cansativa). Oferece bom desafio. São sete estágios, cada um dividido em três partes. Na terceira parte de cada, há um confronto com um monstro gigante. Entre cada um dos estágios, há uma fase de bônus, um jogo de sorte no qual é possível obter mais vidas e poções, desde que se tenha adquirido moedas durante as fases para participar. Há diversas poções que podem ser obtidas em cada estágio, assim como corações que restauram a energia, além de vidas extras. Mas o jogo não oferece checkpoints, passwords ou a possibilidade de salvar o progresso. Se perder uma vida na fase 3-2, por exemplo, volta ao início desta fase 3-2 específica (e detalhe: os itens que já foram coletados não podem ser obtidos novamente). E se todas as vidas forem perdidas, fim de jogo, sem qualquer forma de continuar.


Na mesma época em que vencia as fases do jogo, adquiri a revista Ação Games #6, que trazia um vislumbre de DecapAttack.


Tempos depois, eu já havia finalizado a aventura, outros títulos haviam sido adquiridos e DecapAttack parecia "coisa do passado". Assim, quando comprei a revista VideoGame #11, pouca atenção dei à matéria que apresentava o jogo completo.


Mais à frente, a revista SuperGame ofereceu um belo pôster do jogo, em sua edição de número 9. Revista e pôster se encontram devidamente preservados em minha coleção.


Eis um vídeo com gameplay, do início ao fim, na versão piratex tal qual meu cartucho (até onde pude constatar, exceto pela tela-título, não há diferenças em relação à versão original). A perícia atual não é a mesma dos tempos áureos: penei para vencer algumas fases, demorei mais do que o habitual (o dobro do tempo, certamente), mas consegui terminar a aventura em minha primeira tentativa. Portanto, vale o registro:


E este foi meu primeiro jogo de Mega Drive. Memorável. Enquanto muitos se esbaldavam com "Ruais Forno Greis" em Altered Beast, eu jogava caveiras em diversos monstros. E definitivamente me inseria no que, naqueles dias, era o futuro da jogatina virtual.