E chegou o momento esperado! O
fim da Saga Skywalker nos cinemas. Uma epopéia de 42 anos. Vamos então com uma
análise de Star Wars: Episódio IX - A Ascensão Skywalker. E você já
sabe: texto longo e com SPOILERS (tanto no texto quanto em imagens)!
Insisto no aviso: o artigo a seguir contém SPOILERS, tanto no texto quanto em imagens. Se você ainda não assistiu ao filme, não vá adiante. Procure outro entretenimento. Recomendo a leitura de minhas Lembranças de Star Wars.
Eu avisei. Siga em frente por sua conta e risco.
Repito aqui o que escrevi em
2015, quando da retomada da saga nos cinemas: ao assistir a Star Wars:
Episódio III - A Vingança dos Sith, tinha claro em minha mente que aquela
era a última vez em que veria um filme de Star Wars nos cinemas. Afinal,
este era o posicionamento de George Lucas: a Saga Skywalker nas telonas estava
encerrada. Quase uma década se passou. Veio a aquisição da Lucasfilm pela
Disney em 2012. A Força então despertou. E a franquia retornou às telas de
cinema, com altos e baixos, com ovação em alguns momentos e controvérsias em outros.
E eis que atingimos o nono filme
que envolve a família Skywalker. Os combates entre a Primeira Ordem e a
Resistência se acirram ainda mais, quando se descobre que, de alguma forma, o
Imperador Palpatine ainda vive e, durante todo este tempo, reuniu recursos para
uma grande frota de naves capazes de destruir planetas inteiros e decretar o
fim da Nova República e o domínio de uma Ordem Final. Cabe aos heróis Rey,
Finn, Poe Dameron e seus aliados encontrar uma forma de deter o revivido vilão.
Como esperado, o Episódio IX é
mais um deleite visual e sonoro. Em termos técnicos, há pouco a criticar.
Efeitos especiais competentes, com preferência por efeitos práticos, sempre que
possível. A trilha sonora de John Williams, mais uma vez, é primorosa, a citar praticamente
cada um dos temas de todos os filmes anteriores.
A trama oferece mais aventura e
diversão. E, ao contrário do Episódio VIII e do filme-solo do Han Solo, menos engajamento politicamente
correto e políticas identitárias. Ainda estão lá (e, infelizmente, é assim com
quase todo filme hoje em dia), mas não tomam o foco.
Em termos de atuações, o trio
principal mostra ótimo entrosamento, o que também causa lamento, já que poderiam
(ou deveriam) ter interagido mais desde o Episódio VII. Seja como for, o que tivemos neste filme foi muito bacana. Finn se tornou um
personagem mais interessante, além de descobrirmos que ele é sensitivo à Força.
Chevie e C-3PO também tiveram seus momentos. Lando Calrissian pouco fez, mas foi muito bom ver Billy Dee Williams nas telonas novamente, mesmo que o retorno do personagem seja nada além de um grande fan service (além de que a franquia ficou sem personagens clássicos humanos para se juntarem à ação).
Já R2-D2, coitado, ficou novamente relegado a segundo plano. BB-8 novamente ganha destaque. agora acompanhado por D-O. Se o novo dróide nada adiciona à trama, também não atrapalha. Apenas mais um personagem bonitinho. Afinal, é preciso vender brinquedos também.
Zorri Bliss, Jannah, General Pryde. Os novos personagens são inseridos de forma casual (até desleixada, alguns podem dizer), mas cumprem seus papéis sem se tornarem pedantes. E Babu Frik certamente ganhou a simpatia do público.
Adam Driver mostra competência
mais uma vez, ao acompanharmos a redenção de Ben Solo. Não mais o chiliquento dos filmes anteriores, mas um personagem realmente atormentado por suas escolhas. Entretanto, Kylo Ren, o
Líder Supremo, perde o posto de vilão da vez.
E é justamente este um ponto
criticável do filme.
Seja pela ineficácia em consolidar
Snoke, seja pelas decisões questionáveis de Rian Johnson em "Os Últimos
Jedi", seja por falta de planejamento ou por qualquer outro motivo, foi
preciso trazer de volta o maior vilão da saga: o Imperador Palpatine. Por outro lado, no conceito original de George Lucas, o Imperador só
apareceria mesmo no Episódio IX, quando seria confrontado por Luke e
Leia (que não eram irmãos). Lucas mudou os planos quando chegou a hora
de filmar "O Retorno de Jedi" e o resto é História. De qualquer forma, vale pela oportunidade de testemunharmos Ian McDiarmid mais uma vez em todo seu esplendor como Darth Sidious.
E afinal de contas, como
Palpatine voltou? No Episódio VI, ele foi jogado em um fosso da
Estrela da Morte e, supostamente, "explodiu" antes mesmo de atingir o
fundo. Provavelmente usou magia Sith para escapar da morte certa. Se mesmo Darth Maul conseguiu sobreviver a uma queda similar, cair em um fosso sem ser cortado ao meio é nada para o maior lorde Sith.
Mais do
que isso, finalmente descobrimos a origem de Rey. E temos uma explicação para
seus "super-poderes". Rey é neta de Palpatine. É irônico notar que a Saga
Skywalker, no fim das contas, também se tornou a Saga Palpatine. Rey se
identifica como Skywalker, mas basta um exame de sangue para revelar quem ela
realmente é. Mas aí já entra em cena aquela conversa enfadonha sobre agendas
politicamente corretas e políticas identitárias, do tipo "não importa sua
linhagem, sua biologia, só importa como você se identifica".
Legado é uma palavra relevante
nas tramas da franquia, portanto, importa, sim, quem você realmente é, de onde
você vem, qual seu passado, sua linhagem. Leia teve que conviver com seus dois
legados, de ser uma Organa e uma Skywalker, de ser uma princesa de Alderaan e,
como depois descobriria, filha de Darth Vader. Rey terá que fazer o mesmo.
Ignorar sua linhagem não enobreceria seu caráter. Ela é uma Palpatine por
sangue, uma Skywalker por adoção e escolha. Até darei um desconto, já que Ben
Solo passou a ela sua essência, ao salvá-la da morte. Então ela tem
legitimamente um pouco de Skywalker dentro de si. Mas, neste caso, também tem
um pouco de Solo. Pronto, agora a confusão ficou completa.
O que quero afirmar é que o nome
não faz a pessoa, mas sim o contrário. Rey teria a chance de transformar o nome
Palpatine em algo positivo. Enfim, é apenas um devaneio sobre esta questão.
Certamente, em nosso "mundo real", nomes como "Hitler" não
seriam muito enaltecidos por descendentes, provavelmente.
O Episódio IX teve que perder
tempo explicando ou desfazendo erros do Episódio VIII. Quase tudo de "Os
Últimos Jedi" foi descartado ou "remendado". Por exemplo, a Manobra Holdo, avessa às
"leis do universo" da saga, agora é mostrada justamente como algo
completamente atípico, difícil de replicar.
Revelar Hux como um espião foi a
maneira de justificar sua completa incompetência no filme anterior e, ao mesmo tempo, tentar dar alguma importância ao personagem.
Rose Tico foi colocada para
escanteio. Não fez falta e só mostrou que era desnecessária
desde o começo. Lastimável, já que Kelly Marie Tran a interpretou com dedicação
e merecia mais. Ao menos desta vez, nos seus poucos momentos, Rose é tolerável.
Jar Jar Binks mandou um abraço.
O humor voltou a ter o tom de Star
Wars, calcado na ironia e no sarcasmo, bem diferente das "piadinhas de
sitcom" vistas no Episódio VIII.
Mas acredito que o principal
"tapa na cara com luva de pelica" dado em Rian Johnson foi a cena de
Luke com o sabre-de-luz.
"A arma de um Jedi merece
mais respeito".
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Como diz a primeira frase do
letreiro de abertura: "Os mortos falam"! E, de fato, eles têm muito a
dizer. "Deixe o passado morrer", como explanado no Episódio VIII,
agora parece uma afirmação pueril, insossa, típica de quem não está acostumado
(ou interessado) em preservar a própria memória. Sinal dos tempos?
Justamente por ter que se preocupar
com explicações, reparos e retratações do que foi mostrado no Episódio VIII,
boa parte do filme tem um ritmo frenético, entrecortado, com muito acontecendo
em pouco tempo. Só nos primeiros 45 minutos de projeção, temos Kylo Ren a encontrar o
Imperador, os heróis descobrem sobre Palpatine e fogem das forças da Primeira
Ordem, Rey treina sob tutela de Leia e tem visões, os heróis se reencontram, os
vilões preparam seu ataque, a Resistência planeja suas ações, os heróis viajam
a dois planetas, são perseguidos pelos inimigos, encontram Lando, Chewie
supostamente morre, 3PO tem sua memória apagada e supostamente se despede de
nós.
Fica a sensação de que muito
disto poderia ter sido mostrado ou indicado nos filmes anteriores, o que evidencia que o planejamento da Nova Trilogia não foi exatamente consistente. J.J. Abrams
definiu o terreno com o Episódio VII, mas deixou tudo em aberto, sem parâmetros
para que Rian Johnson seguisse. Assim, Johnson teve carta branca para avançar
como quisesse. A escolha de subverter todas as fórmulas e "desconstruir
personagens" não se mostrou a mais acertada e para Abrams restou a
inglória tarefa de "revisar" algumas destas decisões. Ato falho da Lucasfilm, ainda mais quando comparamos com o que tem
sido feito pela Marvel, por exemplo (e cito a Casa das Idéias justamente por
ser símbolo de um universo cinematográfico coeso, com poucas discrepâncias e,
principalmente, porque a fórmula de lançar um ou mais filmes por ano foi
adotada pela Lucasfilm, sem o mesmo sucesso).
O filme poderia ter se arriscado mais com
a morte de Chewie e o reset na memória de C-3PO. Do jeito que ficou,
estes dois eventos tiveram impacto reduzido. São dois personagens icônicos
e queridos, cujos sacrifícios seriam sentidos pelo público. E, especialmente no
caso de 3PO, acho que restaurar sua memória logo em seguida removeu um pouco do
heroísmo na atitude do dróide.
Já que o assunto é morte... Snap Wexley é um personagem que
ganhou a afeição dos fãs, a partir de suas aventuras na trilogia de livros Aftermath.
No filme, sua morte causa impacto, pois foi justamente no Episódio IX que Snap
teve mais tempo em cena, com diálogos maiores.
Cito a seguir alguns exemplos de fan service.
Wedge Antilles de volta. Sua aparição dura um segundo, mas foi suficiente para me fazer vibrar na poltrona.
Wedge Antilles de volta. Sua aparição dura um segundo, mas foi suficiente para me fazer vibrar na poltrona.
Finalmente vimos Leia com um
sabre-de-luz em mãos. Algo que os fãs sempre desejaram e que finalmente
aconteceu, mesmo que em um rápido flashback.
A cena com Han Solo foi bacana,
até mesmo tocante, mas se não tivesse acontecido, não faria muita diferença na
trama.
Teria sido interessante se alguns Jedi aparecessem diante de Rey no embate final com o Imperador. Ouvimos as vozes de alguns, como Yoda, Obi-Wan, Ahsoka Tano, Anakin e Luke, mas se tivessem surgido diante de Rey e Palpatine, a cena poderia ter mais impacto. Ou talvez ocorresse o contrário e a cena perderia a graça. Enfim, do jeito que está, ficou muito bom.
Entretanto, alguns momentos
poderiam ser melhores. O embate final de Rey contra Palpatine foi
anti-climático. O mesmo pode ser dito do batalha aérea. Além disso, o final do
filme repetiu a fórmula vista em Vingadores: Ultimato: um combate
inicial, os heróis subjugados pelas forças inimigas e, quando tudo parece
perdido, numerosos aliados se juntam para combater os vilões. A fórmula
funciona (principalmente com ajuda da trilha sonora que empolga), mas não deixa
de parecer imitação, ainda mais no último diálogo entre Rey e Palpatine.
- "Eu sou todos os
Sith".
- "E eu... eu sou todos os
Jedi".
Só faltou Rey dizer "E eu...
sou o Homem de Ferro".
Assim como fez no Episódio VII,
J.J. Abrams repete as situações (desta vez de "O Retorno de Jedi") em
diversos momentos: Luke aparece para Rey e diz que ela deve confrontar Palpatine
(praticamente uma cópia da cena entre Luke e Obi-Wan no Episódio VI). O mesmo
pode ser dito da batalha final, bem como do vilão que se sacrifica pelo herói
(Vader por Luke, Kylo Ren por Rey).
Muito se comenta sobre J.J.
Abrams e suas "caixas de mistérios". O diretor é famoso por criar tramas com instigantes mistérios, para depois não resolvê-los (ou resolvê-los de formas pra lá de questionáveis). Muito do que Abrams "semeou" no Episódio VII (e que por algum milagre Rian Johnson cultivou no Episódio VIII) é resolvido no Episódio IX com pouca inspiração.
O epílogo da batalha, em que
vemos as forças da Primeira Ordem derrotadas, mais parece uma recauchutagem do
final de "O Retorno de Jedi", inclusive com vislumbres da Cidade das
Nuvens e da lua florestal de Endor. Wicket e seu filho mandaram um abraço.
Conforme comentei, Ben Solo e Rey substituíram Luke
e Leia contra o Imperador. A Díade da Força é também uma bela referência a
Revan e Bastila Shan, de Knights of the Old Republic.
Alguns pensamentos aleatórios:
O Episódio IX é um apanhado de tudo que deu certo nos demais filmes da franquia. Uma coletânea de cenas, situações e citações que funcionaram nas produções anteriores e funcionam novamente aqui.
O Episódio IX é um apanhado de tudo que deu certo nos demais filmes da franquia. Uma coletânea de cenas, situações e citações que funcionaram nas produções anteriores e funcionam novamente aqui.
Os três filmes não oferecem consistência
como uma trilogia, especialmente porque o Episódio VIII desenvolve os
personagens, mas não desenvolve a trama geral.
A Nova Trilogia desfaz conquistas dos filmes anteriores? Afinal, Palpatine não morreu no Episódio VI. Assim, Anakin Skywalker era o Escolhido ou não?
A Nova Trilogia desfaz conquistas dos filmes anteriores? Afinal, Palpatine não morreu no Episódio VI. Assim, Anakin Skywalker era o Escolhido ou não?
O que a maioria queria ver na Nova Trilogia era o
trio lendário reunido uma última vez.
No fim das contas, o saldo é
positivo para a Nova Trilogia, ainda que, em muitos momentos, tenha feito as Prequels
(Episódios I, II e III) parecerem obras-primas. Os arcos dos personagens foram
encerrados de forma satisfatória, pontas soltas foram amarradas. O bem venceu o mal. E Chewie
finalmente recebeu sua medalha.
E assim se encerra a Saga
Skywalker. Uma bela jornada de quatro décadas. E como sempre, o que realmente
importa é o caminho percorrido e não exatamente o destino em si. Fica o legado.
Ficam os ensinamentos: apreciar, admirar e preservar o que deu certo, refletir
sobre o que não foi tão bem-sucedido. E parece que estas lições já geram
frutos, visto que The Mandalorian é um contundente exemplo do encanto
retomado da franquia. Que seja assim por muitas outras décadas.
E que a Força esteja conosco...
Sempre!