domingo, 14 de julho de 2019

A "versão beta" de Mortal Kombat no Mega Drive

Momento de discorrer sobre os primeiros passos do clássico jogo de luta no memorável dispositivo caseiro de jogos eletrônicos da Sega.



Em 1992, os fliperamas do mundo todo foram apresentados a uma obra singular: Mortal Kombat. Um jogo de luta, no estilo sacramentado pelo igualmente clássico Street Fighter II. Entretanto, a produção da Acclaim se diferenciava pelos gráficos digitalizados, pela temática que remetia a filmes antigos de artes marciais e pela violência exagerada.


Com o estrondoso sucesso do jogo nos fliperamas, qualquer pessoa com dois neurônios capazes de fazer sinapse sabia que era questão de tempo até que MK recebesse versões para os consoles de videogame da época, mesmo com as concessões gráficas e sonoras que se faziam necessárias para adaptá-lo de forma satisfatória. Assim como o rival da Capcom, os embates entre Scorpion, Sub-Zero e toda a turma foram anunciados para a jogatina caseira pouco tempo depois.

A rivalidade entre Sega e Nintendo foi às alturas. Além das versões de Street Fighter II, agora teríamos Mortal Kombat para jogar, comparar e debater de forma acirrada. As campanhas de marketing foram intensas, inclusive com um dia especial para o lançamento, que ficou mundialmente conhecido como Mortal Monday (já que o jogo foi lançado em 13 de setembro de 1993, uma segunda-feira).


Como dono de um glorioso Mega Drive, acompanhei com grande interesse cada notícia sobre o lançamento de MK para o console. Ainda mais quando foi confirmado que a versão para o Mega, apesar dos gráficos e sons inferiores aos do jogo para Super NES, teria todos os golpes fatais e sanguinários da versão de fliperama.

E justamente por acompanhar as matérias das revistas de videogame da época, percebi sutis diferenças no que foi mostrado. Vi a primeira imagem de Mortal Kombat para o Mega Drive na revista Videogame #28.


Nesta edição há uma cobertura da Summer Consumer Electronics Show, feira promovida em Chicago, em 1993, que apresentou as principais novidades do ramo, incluindo os lançamentos de jogos eletrônicos. E assim, tive o primeiro vislumbre de Mortal Kombat no Mega Drive e no Super NES.


Nem precisaria comentar que a imagem de Raiden eletrocutando Scorpion no Mega Drive está gravada eternamente em minha memória.


Mas aqui começaram as suspeitas. O cenário parecia estranho. Com um fundo mais escuro (diferente do azulado dos fliperamas) e sem a estátua de Liu Kang (trocado por um dos ninjas). O medidor de energia também estava diferente. A mesma questão de cenário com cor de fundo diferente parecia acometer a foto da versão do Super NES.


Vale lembrar que, à época, capturar imagens de jogos era tarefa inglória. Em geral, simplesmente se tirava uma foto da tela do aparelho de televisão ou da máquina de fliperama enquanto o jogo era reproduzido. E nestes casos acima, muito provavelmente o fotógrafo não calibrou bem sua máquina fotográfica, o que ocasionou as cores estranhas. E, com isso, diversos rumores de que as versões caseiras trariam cenários diferentes do fliperama.

Para a versão do Mega Drive, esta conversa se intensificou quando as revistas concorrentes publicaram outras fotos, que mostravam novamente o mesmo cenário (Warrior Shrine) com as cores supostamente alteradas. Uma foto publicada na revista Supergame #24 causou furor ao mostrar Liu Kang enfrentando Goro fora do cenário Goro's Lair (único local onde o homem-dragão aparece no jogo). A imaginação correu solta. Teríamos um Mortal Kombat: Champion Edition para o console da Sega, com a possibilidade de controlar os dois "chefões" do jogo, Goro e Shang Tsung?


O jogo foi lançado e tudo não passou de boataria, exceto pelo sumiço da estátua de Liu Kang. A versão para Mega Drive é uma adaptação bastante fiel dos fliperamas (dentro das capacidades do console), com a jogabilidade e a estrutura do jogo intactas. O que aconteceu é que foi exibida na SCES 1993 uma versão prévia, ainda em desenvolvimento (a popular "versão beta"). A revista Ação Games #38, ao cobrir a feira, já alertava sobre isso.


O mesmo ocorreu com a "versão beta" de Street Fighter II, como já mostrado aqui no blog. E assim como o jogo da Capcom, esta versão prévia de Mortal Kombat para o Mega Drive nunca mais foi vista, mesmo nos tempos atuais de emuladores, ROMs e preservação de jogos. O mistério e o charme desta versão só aumentam.

No exterior, revistas como a GamePro #48 e a Mega #10 também publicaram tais imagens (e imagino que justamente esta edição da GamePro serviu de fonte para as revistas nacionais).

 

A revista Mega, inclusive, publicou uma imagem do que seria o menu inicial do jogo no Mega Drive, completamente diferente da versão final. Não há consenso que de fato esta imagem seja do Mega Drive (muitos especulam que seria de uma "versão beta" do Super NES).


A título de comparação, eis o menu principal do jogo para Super NES. Note a ausência da opção Exhibition


Na versão final do Mega Drive, esta tela simplesmente não existe. Temos uma tela similar, com os dizeres Press Start, que leva ao menu principal, diferente das imagens acima. 

 

Também se observa que, nas versões caseiras, o personagem Raiden teve seu nome alterado para "Rayden" (na versão prévia do Mega Drive o nome estava escrito corretamente). Até hoje é difícil precisar causa, motivo, razão ou circunstância para isso. Alguns afirmam que foi para evitar problemas legais relacionados a Raiden, jogo de nave produzido pela Seibu Kaihatsu e publicado pela Tecmo em 1990. Outros acreditam que foi devido à existência de outro personagem de nome "Raiden" no jogo Fatal Fury, da SNK. Vai saber.


Enfim, é mais uma peculiaridade no magnífico mundo dos games. Um dia estas "versões beta" virão à tona, serão preservadas e poderão ser apreciadas uma vez mais. Enquanto isso não acontece, o jogo em sua versão final é mais do que suficiente, não é mesmo? 


Agora dá licença, que vou tentar encontrar o Pit Fighter II.