quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A queda do morcego

Hora de comentar o mais novo filme do Batman.


Já aviso: a resenha ficou longa (e com spoilers).

Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge é o capítulo final da trilogia criada por Christopher Nolan, com uma proposta mais realista para o universo do homem-morcego.

Este terceiro filme encerra a saga de Bruce Wayne de forma satisfatória e definitiva.

O filme se passa oito anos após Batman - O Cavaleiro das Trevas e inicia apresentando o vilão Bane, em uma seqüência intensa, em que este mostra sua força e inteligência. Somos então levados a Gotham City, que vive um momento de paz e prosperidade, em que os bandidos estão na prisão graças a uma lei criada após os eventos do filme anterior.

Com os bandidos presos e a cidade em segurança, Bruce Wayne se "aposentou", tornando-se um homem recluso e reticente. Sente-se sem propósito, uma vez que o Batman não é mais necessário, e ao mesmo tempo profundamente triste com a morte de Rachel Dawes.

Tudo começa a mudar quando, durante uma festa em sua mansão, Wayne é roubado "na cara dura" por uma misteriosa mulher, de nome Selina Kyle. Ao mesmo tempo em que decide investigar mais sobre esta mulher, fica sabendo de acontecimentos preocupantes envolvendo seu grande aliado, o Comissário Gordon. Estes acontecimentos são referentes a Bane e seu plano de tomada e destruição de Gotham. Tudo isso é suficiente para "reacender a chama" e trazer o homem-morcego de volta à ativa, muito a contra-gosto de seu fiel mordomo (e figura paterna), Alfred.

Com o Comissário Gordon ferido após seu encontro com Bane, Wayne ganha um novo aliado, o policial John Blake, que espantosamente descobriu a identidade secreta do Batman.

Como se tudo isso não fosse suficiente, o milionário ainda precisa lidar com sérios problemas em sua empresa, com enormes gastos e pouco lucro. Neste momento, surge outra mulher em sua vida: Miranda Tate, o que parece ser uma solução para os problemas da empresa.

Está traçado então o panorama, o tabuleiro no qual os personagens interagirão.


Mais uma vez, temos um ótimo filme do Batman. Uma ótima adaptação, com grandes atuações, uma boa trama (simples, mas ainda assim eficaz), algumas reviravoltas e, finalmente, boas cenas de luta entre herói e vilão.

O embate entre Batman e Bane merece destaque. É um momento icônico dos gibis, que neste filme é reproduzido com maestria. Temos um enfrentamento brutal, em que o Batman finalmente encontra um adversário fisicamente superior.

A trama principal, o ressurgimento de Bruce Wayne/Batman após ser derrotado por Bane, é carregada em drama e superação, mas não pude evitar a comparação com Rocky III, em que o protagonista demonstra grande soberba/despreparo em relação a seu adversário, é derrotado, passa por grande provação para se reencontrar e ressurge determinado a estraçalhar seu antagonista. 

Como afirmei acima, finalmente em um filme da trilogia de Nolan, tivemos boas cenas de luta entre herói e vilão, deixando para trás as fracas cenas dos filmes anteriores, onde imperavam os cortes rápidos, em que muito acontecia, mas pouco se via.


Vale também ressaltar a predileção do diretor em aplicar efeitos especiais práticos, feitos no set, no momento da filmagem, ao invés de utilizar o CGI. As poucas cenas com efeitos computadorizados (geralmente envolvendo a geringonça The Bat) são competentes e não chamam a atenção para si.

As atuações são excelentes, no geral.

Michael Caine rouba a cena como nunca neste filme. Cada momento de seu Alfred é primoroso e mostra que, se Bruce Wayne havia perdido sua humanidade para o Batman, Alfred sempre esteve ali para tentar restaurá-la. Mesmo que para isso seja preciso se apoiar em uma mentira, tal qual o Batman e o Comissário Gordon fizeram para tentar livrar Gotham da criminalidade.

Christian Bale "ressurge", com um Bruce Wayne ainda mais complexo. Além disso, vale notar que Bale suavizou a entonação da voz do Batman (ou esta foi alterada na pós-produção, assim como a voz de Bane), tornando seus diálogos mais claros.

Tom Hardy apresenta um antagonista ameaçador, tanto física quanto psicologicamente. Conseguiu transformar um vilão mediano dos gibis em um personagem de respeito neste filme.

E Joseph Gordon-Levitt mais uma vez demonstra competência, com um personagem direto, idealista, um reflexo da inspiração que Bruce Wayne sempre quis apresentar com o Batman.

É "chover no molhado" dizer que o filme é bem-produzido, com excelente trilha sonora, ótimas atuações e boa trama. O filme é tudo isso e mais um pouco. Mesmo assim, se comparado com seu antecessor, ainda é mais fraco. Eu mantenho um empate entre Batman Begins e "O Cavaleiro das Trevas Ressurge", deixando "O Cavaleiro das Trevas" no posto de melhor filme da trilogia, sem sombra de dúvida.

O filme se apresenta denso e com várias subtramas, envolvendo diversos personagens. Entretanto, alguns destes são mal-aproveitados ou pouco explorados (algo que acontece muito em "terceiros filmes" de trilogias).

Miranda Tate está ali pura e exclusivamente para ser o elemento de reviravolta final da trama. Infelizmente, a grande revelação sobre sua identidade já havia sido mostrada em fotos de bastidores do filme (mas quem não viu terá uma boa surpresa). Mesmo assim, a presença de sua personagem acaba atrapalhando, acredito, transformando o grande plano de destruição de Gotham em um simplório plano de vingança (bem como relegando o vilão Bane a um papel de capanga).

O personagem de Matthew Modine também está ali sem muita função no filme. Sua participação no início da "batalha campal" de Gotham até empolga, mas seu destino é tão sem graça (mesmo que realista ao extremo).

E o momento polêmico desta resenha: apesar de Anne Hathaway ter apresentado talvez a Mulher-Gato mais fiel aos gibis clássicos do Batman, esta não tem grandes utilidades para a trama. Todas as suas ações poderiam ser desempenhadas por qualquer outro personagem. Sua aproximação de Bruce Wayne fica estranha, principalmente pelo fato deste ser roubado e traído pela vilã e mesmo assim confiar cegamente nela. Sim, o Batman entende a Mulher-Gato e vice-versa, mas nesta proposta realista de Nolan, faltou um pouco de coerência nas ações de Wayne para com Selina.


Algumas inconsistências existem, mas podemos dar um desconto.

Afinal, como Blake descobriu a identidade secreta do Batman? E mais importante, por que Bruce Wayne não faz qualquer esforço para negar quando confrontado por Blake? Já estava vendo Blake como um sucessor? Ainda, como Wayne consegue voltar do exílio tão rapidamente, quando estava falido? Como consegue entrar em Gotham, uma vez que a cidade estava sitiada? Tudo bem, ele é o Batman (mas para a proposta realista de Nolan, não fica forçado?). E Bane se mostra surpreso quando o Batman reaparece. Nenhum de seus seguidores teve capacidade para informar que Wayne escapou da prisão?

Há momentos forçados também, simplesmente para fazer referências gratuitas. Ou vão me dizer que a revelação do primeiro nome de John Blake não soou gratuita? Pelo menos sua entrada na batcaverna fez uma bela referência aos gibis, com o personagem se balançando em uma corda, tal qual um certo menino-prodígio.

A rápida aparição de Liam Neeson também pouco adiciona à trama, parecendo que ele foi jogado em cena só para criar mais uma ligação com o primeiro filme (ligação que já estava ali, graças a flashbacks). E como foi possível recuperar a geringonça The Bat em boas condições, após tudo que aconteceu? Uma forçadinha, só para apresentar a informação de que o piloto-automático do veículo havia sido implementado por Bruce Wayne.

Já a presença de Cillian Murphy como o Dr. Crane (o Espantalho) é interessante, apresentando a idéia de que "os loucos tomaram conta do hospício".

Acho que o filme padeceu um pouco em seu ritmo, principalmente na segunda metade, quando Bruce Wayne está na prisão de Bane. Além disso, são quase três horas de projeção e, ao contrário do filme anterior, as horas não passaram rapidamente, ao menos não para mim.

Enfim, apesar de alguns pequenos e perdoáveis deslizes, Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge é um ótimo filme, não tão bom quanto o anterior (e isto seria mesmo impossível), mas ainda assim um final digno para uma trilogia que mostrou que um grande personagem das HQs pode ter grandes filmes, com bases realistas (mesmo que algumas vezes para o desgosto dos fãs) e com grande respeito à obra original.