domingo, 17 de dezembro de 2017

A trilogia dos equívocos e o universo em perigo

Finalmente resolvi escrever sobre o filme da Liga da Justiça.


Siga com a leitura, a saber que o texto pode conter SPOILERS.

Infelizmente, é mais uma tentativa frustrada da DC para consolidar seu universo cinematográfico. O filme tem diversas cenas apressadas (e por vezes desconexas), muitas vezes dando a impressão de serem apresentadas apenas para mostrar um ou outro personagem, a fim de expandir o universo o mais rápido possível. Logo vem à mente Mortal Kombat: A Aniquilação e sua profusão de personagens que surgem, somem e pouco (ou nada) acrescentam à trama.

É lamentável constatar que, apesar de alguns bons momentos, o filme simplesmente não empolga.


A duração da projeção se manteve em duas horas, o que é um alívio, mesmo que, para um filme com tantos personagens, uma duração um pouco maior talvez fosse a melhor saída. Ainda assim, se for para "encher lingüiça", é melhor manter o filme o mais breve possível. E já que há muitas cenas excluídas (das que foram apresentadas nos trailers às que ninguém viu mesmo), certamente uma versão estendida será lançada em home video. Resta saber se trará mais consistência à trama.

O filme pode ser visto como a terceira parte de uma trilogia do Super-Homem, iniciada com Homem de Aço e seguida por Batman vs Superman: A Origem da Justiça. E tal qual os filmes anteriores, este peca em quesitos similares: uma super-produção com elenco competente, mas que se perde em uma trama apressada e na descaracterização de alguns personagens em prol de um "realismo" desnecessário.

A trilha sonora de Danny Elfman é muito boa e inclui citações aos temas clássicos de Batman e Super-Homem. Mas faltou um tema memorável para a Liga.

O filme aposta mais no humor e no clima leve. Aquaman tem boas tiradas (mesmo que isto o descaracterize um pouco). O problema é que o humor muitas vezes surge sem qualquer causa, razão, motivo ou circunstância, ainda mais quando colocado ao lado dos filmes anteriores. Ou seja, o Super-Homem, que passou dois filmes sendo um personagem melancólico e introspectivo, agora esbanja alegria e piadinhas. O mesmo acontece com o Batman. A mudança de ares a que a DC se propôs é bem-vinda, mas brusca demais em alguns momentos (novamente, trama apressada). Falta consistência ao universo que os três filmes encapsulam.

Dois dos personagens mais interessantes da trama, Cyborg e Flash, são pouco explorados. O que vimos deixa um "gostinho de quero mais". Pelo menos isso. Já a personagem mais bem-sucedida da DC nas telonas pouco contribui. A Mulher-Maravilha tem uma introdução bacana no início do filme, mas depois se torna figurante de luxo.


Já comentei sobre Homem de Aço (leia em Não é um 'S'). Sobre Batman vs Superman escrevi em Visionário?. Em ambos os casos, a conclusão é a mesma: Zack Snyder não entendeu os personagens que tinha em mãos, tentou reinventar a roda e os resultados foram questionáveis. Até certo ponto, o mesmo pode ser dito sobre o filme da Liga.

A DC e os fãs não podem mais culpar (exclusivamente) Zack Snyder. Embora ele seja creditado como diretor, é de conhecimento público que ele foi respeitosamente colocado para o canto após Batman vs Superman. Joss Whedon (diretor dos dois primeiros filmes dos Vingadores) foi recrutado para reescrever partes do roteiro e dirigir refilmagens. E mesmo assim, não foi suficiente.

Esta breve análise sobre a "trilogia dos equívocos" nos leva a observar o Universo Cinematográfico DC (ou DCEU, como queira), até o momento composto por cinco filmes, sendo que apenas um realmente acertou o alvo.

Esquadrão Suicida se perdeu ao tentar ser o "Guardiões da Galáxia da DC", também reunindo um grupo de personagens pouco populares e utilizando músicas pop em sua trilha sonora. A diferença é que os personagens são rapidamente jogados em cena. E enquanto no filme dos Guardiões a trilha sonora ajuda a contar a trama, no filme do Esquadrão as músicas estão ali apenas porque são bacanas. O roteiro coloca personagens de segundo escalão, que deveriam combater ameaças menores, às voltas com um adversário completamente superior, em mais uma trama de "grupo incomum contra entidade cósmica que pretende destruir o mundo abrindo um portal no céu". A lástima se dá quando percebemos (ainda mais pelo que foi mostrado nos trailers) que o filme seria muito melhor se tivesse seguido a fórmula de Fuga de Nova York, mas com os personagens da DC. Ou seja, uma personalidade importante é capturada em uma parte proibida da cidade (pelo Coringa, talvez) e um grupo de renegados é selecionado para resgatar o refém, em um determinado tempo. Simples e eficaz. Mas foram tentar inventar moda...


Já o filme da guerreira amazona teve a vantagem de surgir após três filmes bastante criticados. E já com uma clara intenção da DC de mudar o tom de suas obras. Com um roteiro leve, aventuresco e heróico, a produção conseguiu se apresentar de forma coerente, embora mais uma vez com um vilão ultra-poderoso que desejava acabar com o universo (mas de acordo com a mitologia apresentada na obra, ao contrário do que foi visto em Esquadrão Suicida).

 
Meu ranking dos filmes da DC:

1) Mulher-Maravilha (um sopro de alegria em meio ao marasmo)
2) Liga da Justiça / Batman vs Superman / Homem de Aço (sim, empatados, todos com algumas boas qualidades, mas repletos de equívocos)
5) Esquadrão Suicida (apenas uma oportunidade perdida).

É impressionante como a DC não consegue acertar o tom, apesar de todos os esforços. E o desapontamento se torna maior quando lembramos que, nos anos 1980 e 1990, era a DC quem dava as cartas, com os filmes do Super-Homem e Batman. É impressionante como a Marvel consegue emplacar filmes de personagens de segundo escalão, como Guardiões da Galáxia e Homem-Formiga, enquanto a DC não consegue entregar um filme coeso da Liga da Justiça.

Os fatos são inegáveis: se há uma década alguém dissesse que um filme do Thor (de cabelos curtos e sem Mjolnir) faria mais sucesso que um filme da Liga da Justiça, este alguém provavelmente seria enviado ao Asilo Arkham para permanência definitiva. Este é o panorama da DCEU, principalmente quando comparado aos filmes da Marvel. A diferença está na eficiência que a Marvel aplica ao planejamento de seus filmes e de seu universo (incluindo as séries de TV e da Netflix) e a competência na execução dos mesmos.

Que novos ares tomem conta dos vindouros filmes. Que os equívocos sirvam como valorosa lição, para acabar com os perigos que ameaçam o universo DC nos cinemas.